Estamos atravessando um triste momento, que certamente permanecerá vivo na memória de nosso país por décadas. Na última semana ultrapassamos a infeliz marca de quatro milhões de infectados pelo novo coronavírus, e mais de 120 mil mortes em razão da Covid-19.
As consequências dessa pandemia para o futuro permanecem incertas – já que ainda estamos sofrendo seus efeitos –, mas, além da tragédia humana, é fato que também estamos enfrentando uma crise econômica sem precedentes.
Nossas empresas foram surpreendidas por um elemento externo, praticamente impossível de prever, que demoliu qualquer planejamento estratégico, expectativas de desempenho e retorno de investimentos.
Salvo poucas empresas, de setores muito específicos, todos foram atingidos pela crise. vejam que, na semana passada, o IBGE divulgou que o PIB brasileiro caiu 9,7% no 2º trimestre de 2020, em comparação ao 1º trimestre – uma verdadeira tragédia em nosso setor produtivo.
É nessa lamentável circunstância que o parlamento tem buscado, na medida do possível, mitigar os efeitos da pandemia sobre a nossa atividade econômica.
Temos a certeza de que essa situação é conjuntural. Temos debatido e aprovado projetos que almejam alimentar uma recuperação econômica o mais célere possível. e o projeto de lei Nº 6.229, de 2005, que atualiza nosso direito falimentar e recuperacional, é um deles.
Vejam que, em nosso direito empresarial, há vasta jurisprudência e elaboração doutrinária que reconhece o princípio da função social da empresa como decorrente do princípio expresso, em nossa constituição, da função social da propriedade.
Nosso ordenamento jurídico demanda todo suporte para que os agentes econômicos exerçam suas atividades, gerem empregos, paguem tributos, enfim, contribuam para o desenvolvimento do nosso país.
Mas sabemos que, mesmo em situações normais, muitas empresas passam por dificuldades e podem ficar pelo caminho.
Aqueles empreendedores que dispenderam recursos – financeiros e temporais – para que seus sonhos saíssem do papel necessitam de um arcabouço jurídico que lhe garanta meios de subsistir a essas situações.
Penso que, em meio a nossa atual ordem constitucional, evoluímos muito nesse sentido, a exemplo da lei das falências, de 2005, que sistematizou bons instrumentos para que empresas continuassem em operação.
Não tenho dúvidas de que muitos empregos foram preservados em razão desse instrumento normativo.
Mas passaram-se quinze anos.
A lógica da atividade produtiva há tempos vem enfrentando importantes mudanças que, por si só, já demandariam modificações em nossa legislação. Com a pandemia, a possiblidade tornou-se um imperativo.
Penso ser necessário e urgente modernizarmos a lei de falências, sobretudo para que milhares de outras empresas não venham a fechar as portas quando os demais planos assistenciais do governo se encerrarem. A câmara dos deputados foi sensível a essa exigência, aprovando o PL 6.229/2005 no último mês, e, certamente, o senado também terá esse comprometimento.
Entre outros méritos da proposta, penso que o PL tem o espírito de trazer mais flexibilidade e celeridade às regras de recuperação judicial, recuperação extrajudicial e falência, garantindo mais instrumentos para que empresas não fechem e para que não aprofundemos a recessão por que estamos passando.
Em plena conformidade com nossa constituição, o projeto também traz elementos que reconhecem a obrigação do poder público em contribuir para a preservação de empresas, como, por exemplo, ao estipular melhores condições para a quitação de dívidas com a união por empresas em recuperação judicial.
Ademais, disciplina o financiamento de empresas durante a fase de recuperação judicial, abrindo a possibilidade para que bens da empresa possam ser oferecidos em garantia para a concretização do negócio, além de outros instrumentos que ampliam a viabilidade e o barateamento desses empréstimos.
No projeto, há, também, a previsão de uma inclusão maior dos credores no processo decisório da recuperação judicial, já que poderão apresentar plano de recuperação no caso de rejeição daquele proposto pelo devedor.